Nova fase da ação penal contra golpismo enfrenta manobra da extrema direita 6g2i1c

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STF reage à ofensiva para criar conflito entre os poderes Legislativo e Judiciário. Testemunhas sustentam: Bolsonaro é o chefe da investida golpista.

As audiências no Supremo Tribunal Federal (STF) realizadas na segunda-feira (19) e quarta-feira (21) para colher depoimentos do processo sobre o chamado “núcleo um” da trama golpista denunciada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) inicia nova fase do julgamento, a etapa das oitivas das testemunhas. Esse é o núcleo crucial da trama, integrado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e mais sete réus, os responsáveis pelas principais decisões e ações do plano golpista.

O depoimento mais importante do dia 19 foi o do ex-comandante do Exército e general da reserva, Marco Antônio Freire Gomes, que chegou a ser advertido pelo ministro-relator Alexandre de Moraes por alterar e atenuar o conteúdo do seu depoimento no inquérito da Polícia Federal quando ele disse que o ex-comandante da Marinha, Almir Garnier, teria se alinhado a Bolsonaro na trama golpista.

De todo modo, Freire Gomes confirmou que Bolsonaro apresentou em uma reunião “estudos” aos comandantes das Três Forças sobre a instalação de estado de sítio e Garantia de Lei e da Ordem (GLO). Um documento teria sido “enxugado” pelo então presidente da República, que seria a minuta de golpe. Confirmou também que Felipe Martins, ex-assessor especial de assuntos internacionais do então presidente da República, leu a minuta na presença de Bolsonaro e de Almir Garnier.

Outra confirmação importante foi do ex-coordenador de inteligência da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Adiel Pereira Alcântara. Ele disse que houve ações de “policiamento direcionado” para barrar o trânsito de eleitores do então candidato a presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno das eleições de 2022. Segundo Adiel, houve ordens de ex-diretores da PRF para as blitze de policiamento direcionado e cobrança para que ônibus fossem parados pelos policiais. “Estavam criando uma polícia de governo, e não de Estado”, afirmou.

Em contraste com o recuo relativo do general Gomes Freire, o ex-comandante da Aeronáutica, tenente-brigadeiro Carlos Almeida Baptista Júnior, reiterou ao STF, na quarta-feira (21), de modo categórico, agora da condição de testemunha da acusação, o que dissera à Polícia Federal: sim, houve, logo após a vitória da chapa Lula-Geraldo Alckimin, uma reunião liderada pelo ex-presidente Bolsonaro, no Palácio da Alvorada, para examinar “hipóteses de atentar contra o regime democrático, por meio de algum instituto previsto na Constituição”.

Questionado, Baptista Júnior também testemunhou que ouviu o general Freire Gomes dizer a Bolsonaro que teria de prendê-lo caso levasse adiante a tentativa de golpe. Mas, não só. O ex-comandante da Aeronáutica disse que em 14 de dezembro de 2022, na sede do Ministério da Defesa, o então titular da pasta, general Paulo Sérgio Nogueira, apresentou aos comandantes das três Forças uma minuta golpista.

Diz Baptista Júnior que indagou ao ministro da Defesa se aquele documento indicava impedir a posse do presidente eleito. Diante da resposta positiva, teria se levantado e saído da sala, sem ler a minuta. Finalmente, ao contrário do depoimento dúbio do ex-ministro do Exército, o ex-comandante da Aeronáutica disse que, nessa reunião em dezembro, Garnier afirmou que colocava as tropas à disposição da trama golpista

Essa agem de fase do processo contra os golpistas mostra que a dinâmica do Supremo segue o devido processo legal, com tendências jurídicas indicando condenação de Bolsonaro e de seus cúmplices, num momento em que a extrema direita amarga mais de um fracasso no colégio de líderes da Câmara dos Deputados, com anuência do presidente da Casa, Hugo Motta, de não votar o requerimento de urgência do projeto da anistia.

Até agora, 31 dos 34 denunciados pela PGR se tornaram réus e vão responder pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.

Diante do revés, os bolsonaristas e seus aliados se movimentaram para seguir tentando criar conflito entre os poderes Legislativo e Judiciário, com o intuito de tumultuar o julgamento no STF. Foi o que ocorreu com a tentativa de anular a decisão da 1ª Turma do STF suspendendo integralmente a ação penal contra o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) – ligado à família Bolsonaro e ex-chefe da Agência Brasileira de Investigação (Abin) – por sua participação na investida golpista. A tramitação da denúncia foi mantida pelo STF, com o entendimento de que a imunidade parlamentar formal só vale para crimes cometidos após a diplomação do parlamentar.

A ofensiva se deu pela composição conservadora da Câmara dos Deputados, o domínio da direita e da extrema direita, e se mescla às restrições das emendas parlamentares por decisão do STF para dar mais transparência e garantir a rastreabilidade dos valores envolvidos.

São manobras que afrontam a Constituição, ferindo o princípio da estabilidade entre os poderes, uma tentativa de burlar as prerrogativas de cada um deles. Acima de qualquer decisão, deve prevalecer o que foi estabelecido como essência do Estado Democrático de Direito, o compromisso irrevogável com a democracia. A tentativa de gerar conflitos entre Legislativo e Judiciário é mais uma ação da direita e da extrema direita que deve ser energicamente repelida e combatida pelas forças democráticas.