Ex-ministro da Defesa diz ter alertado Bolsonaro sobre risco de golpe em 2022 6t2d6o

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General Paulo Sérgio Nogueira afirmou ao STF que ele e o comandante do Exército saíram “preocupadíssimos” de reunião com Bolsonaro que discutia medidas inconstitucionais

Paulo Sérgio Nogueira é um dos réus da Ação Penal (AP) 2668 Foto: Fellipe Sampaio/STF

No depoimento prestado nesta terça-feira (10) ao Supremo Tribunal Federal (STF), o general da reserva Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa do governo Jair Bolsonaro, afirmou que alertou o então presidente sobre a gravidade das consequências de uma tentativa de golpe de Estado para reverter o resultado das eleições de 2022. Ele declarou ter saído “preocupadíssimo” de uma reunião com Bolsonaro e outros membros da cúpula militar em que se discutia a decretação de estado de sítio.

Nogueira é réu na ação penal que apura a existência de uma organização criminosa com intenção de subverter o processo democrático. Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), ele teria endossado críticas ao sistema eleitoral, atuado para fomentar a desconfiança contra as urnas eletrônicas e, supostamente, apresentado uma minuta de decreto golpista aos demais comandantes das Forças Armadas — o que negou durante o interrogatório.

“Eu alertei da seriedade, da gravidade, se ele [Bolsonaro] estivesse pensando em estado de defesa, estado de sítio”, disse o general a Alexandre de Moraes, relator do caso no STF. “A gente conversando ali, numa tempestade de ideias, sobre as consequências de uma ação futura que eu imaginava que poderia acontecer.”

Negativas, recuos e pedido de desculpas ao STF

Ao longo de seu interrogatório, Nogueira procurou se dissociar de qualquer articulação golpista, buscando mostrar que tentou moderar o ímpeto autoritário do então presidente da República. Ele afirmou não ter tratado sobre nenhuma “minuta de golpe” com outros militares e disse não ter despachado com Bolsonaro o relatório do Ministério da Defesa sobre as eleições.

“O presidente jamais me pressionou”, disse. “O que me deixa de cabeça quente é saber pela denúncia [da PGR] que eu havia alterado esse relatório.” O general afirmou que todas as conclusões do relatório — que não apontou fraudes — foram baseadas em pareceres técnicos da equipe das Forças Armadas.

Em gesto inédito entre os réus, o ex-ministro pediu desculpas públicas a Moraes por declarações adas contra o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), feitas durante uma reunião ministerial no fim do governo Bolsonaro. “Foram palavras completamente inadequadas. O TSE não é inimigo. Se fosse hoje, não teria feito aquela nota ou teria feito de maneira mais amena”, afirmou.

Nogueira tenta salvar a imagem das Forças Armadas em meio à crise institucional

O depoimento de Paulo Sérgio Nogueira reforça um movimento percebido em outras oitivas de militares no mesmo processo: a tentativa de limitar a contaminação das Forças Armadas pela trama golpista, atribuindo a Bolsonaro e seu círculo mais próximo a responsabilidade pelas propostas autoritárias.

Ao reconhecer que a reunião sobre a decretação de estado de sítio ocorreu, mas se apresentar como voz dissonante e crítica, o general tenta reconfigurar sua narrativa, afastando-se do “núcleo duro” da conspiração, já apontado pela PGR como integrado por Bolsonaro, Mauro Cid, Anderson Torres, Ramagem e Braga Netto.

A fala também representa uma mudança de tom em relação à postura beligerante do bolsonarismo frente ao STF e ao TSE. Embora tenha feito duras críticas institucionais no ado, Nogueira buscou se reposicionar politicamente, talvez já antevendo o julgamento final, previsto para o segundo semestre.

Reta final da instrução e julgamento iminente

O interrogatório do ex-ministro da Defesa é parte de uma fase decisiva do processo penal. O ministro Alexandre de Moraes está ouvindo os oito réus considerados peças-chave na engrenagem do plano golpista. Já depam nomes como o ex-ajudante de ordens Mauro Cid, o ex-diretor da Abin Alexandre Ramagem e o ex-ministro da Justiça Anderson Torres.

O general Walter Braga Netto, ex-ministro e candidato a vice de Bolsonaro em 2022, foi ouvido por videoconferência. Braga Netto está preso desde dezembro de 2024, acusado de obstruir a investigação e de tentar obter ilegalmente informações sobre a delação de Cid.

Concluída a fase de interrogatórios, o STF poderá julgar o mérito das ações penais ainda neste ano. Caso condenados, os réus podem enfrentar penas superiores a 30 anos de prisão — incluindo o próprio ex-presidente Jair Bolsonaro, que também já prestou depoimento no caso.

O peso do silêncio e a guerra pela narrativa

O depoimento de Paulo Sérgio Nogueira não livra o general da possibilidade de condenação, mas revela fissuras dentro da cúpula militar que integrou o governo Bolsonaro. Ao trocar o silêncio por uma tentativa de autopreservação, o ex-ministro ensaia uma ruptura com o discurso negacionista e conspiratório da extrema direita.

Resta saber se a estratégia de arrependimento tardio e reposicionamento institucional será suficiente para mitigar sua responsabilidade penal ou se será vista apenas como uma manobra de contenção de danos às vésperas de um julgamento histórico.

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