Cristina Kirchner alerta para “moratória iminente” e critica Milei 26321j

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Ex-presidente denuncia o colapso econômico sob governo de Javier Milei e chama o peronismo a unir-se contra o “neoliberalismo que ameaça a identidade nacional”

Cristina Kirchner discursa neste 25 de maio no "Encontro da Cultura Popular"

No aniversário de 22 anos da posse de Néstor Kirchner como presidente, Cristina Fernández de Kirchner discursou no “Encontro da Cultura Popular” em Buenos Aires, evento que reuniu artistas, intelectuais e lideranças políticas. A data simbólica — 25 de maio, dia da independência argentina — foi usada para reafirmar a resistência cultural e política contra as reformas de Javier Milei. “A cultura argentina é memória, é sentido, é o que nos une como povo. Eles querem apagar nossa identidade com um ajuste brutal”, afirmou.

Cristina revisitou o conceito de cultura popular para além das expressões artísticas, englobando também os comportamentos sociais e a construção da identidade nacional.
 Em uma data emblemática para a Argentina, que marca o 25 de maio de 1810 e, coincidentemente, os 22 anos da posse de Néstor Kirchner, a líder peronista teceu críticas contundentes às políticas do atual governo, alertando para um “loop” histórico de endividamento e fracasso.

“O default está ao virar da esquina”: crise econômica e falta de dólares
A ex-presidente alertou sobre o risco iminente de default (moratória) argentino, atribuindo a crise à má gestão do governo Milei. “O problema não é o déficit fiscal, como ele insiste, mas a falta de dólares. Se não mudarem o rumo, o colapso será inevitável”, disse, referindo-se às dificuldades para honrar dívidas externas. Cristina destacou que o atual modelo econômico, baseado em cortes de gastos e liberalização, já fracassou no ado — citando os defaults de 2001 e antes — e só agrava a desigualdade.

No contexto atual da Argentina, para ela, vive um “loop” de políticas neoliberais. Ela comparou a situação econômica atual com a década de 90 e a crise de 2001, que culminou no maior default da história argentina, do qual Néstor Kirchner foi “filho”. Kirchner criticou a ideia de que o governo atual “encontrou a fórmula da Coca-Cola”, pois o que está sendo feito “já o fizeram antes”.

A ex-presidenta trouxe à tona a figura de Ricardo Arreazú, economista respeitado pelo presidente Milei e considerado o “autor intelectual e material da Tablita de Martínez de Hoz”, política da ditadura que endividou e desindustrializou a Argentina. Kirchner enfatizou a contradição nos discursos econômicos, onde se culpa o déficit fiscal, mas ao mesmo tempo se ite que os problemas reais surgem da falta de dólares. “Os 9 defaults na Argentina foram porque se ficaram sem dólares”, pontuou.

Críticas às políticas de ajuste: “O 70% da população está excluído”
A líder peronista denunciou o impacto das medidas de austeridade em setores populares. “Nos bairros onde Milei perdeu votos após a primeira volta, a crise chegou primeiro: desemprego, falta de serviços básicos e fome”, afirmou, referindo-se ao resultado eleitoral de 2023. Para Cristina, o modelo neoliberal beneficia apenas 30% da população, enquanto o restante enfrenta desemprego, inflação galopante e desindustrialização acelerada.

Cristina Kirchner desmascarou o que chamou de “bombas de fumaça” lançadas pelo governo para desviar a atenção de temas cruciais, como a crise econômica. Ela mencionou o “Pacto de Maio” do ano ado, que, apesar de toda a discussão, não se concretizou.

A ex-presidenta atacou a “batalha cultural” do governo, especialmente o slogan “seus dólares, sua decisão”, ironizando que um pastelzinho custa “dois lucas” (dois mil pesos). Ela questionou a suposta perseguição fiscal, apontando a alta informalidade da economia, e refutou a ideia de que a Argentina possa se livrar do narcotráfico com 50 milhões de pesos por mês, chamando a afirmação de “idiota”.

Um dos pontos mais incisivos de sua crítica foi a análise da “motosserra”, imagem utilizada por Milei em sua campanha. Kirchner argumentou que a motosserra, inicialmente vista como um instrumento contra o Estado, acabou se voltando contra as grandes maiorias, impactando aposentados e trabalhadores. Ela destacou que a crise atinge primeiro os bairros populares, onde o emprego informal desaparece rapidamente.

Cristina Kirchner fez uma revisão da situação atual da Argentina e do impacto das políticas implementadas pelo Governo de Javier Milei. Ele reiterou que o problema do governo é a falta de dólares e alertou que “o default está ao virar da esquina”.

Mensagens ao peronismo: unidade contra o “inimigo comum”
Em tom de convocação, Cristina pediu ao peronismo que se una para enfrentar o que chamou de “inimigo comum” : o neoliberalismo que, segundo ela, busca “erradicar a história e a identidade nacional”. “Néstor nos ensinou que se pode governar com amor ao povo, sem trair seus valores. É hora de retomar esse legado, com coragem e convicção”, disse, lembrando que o peronismo deve ser um “espaço de resistência cultural e social”.

Para Cristina Kirchner, a Argentina precisa se “repensar”. Ela enfatizou a necessidade de abandonar a “militância eleitoral” para retomar a “militância política”. Isso implica em ter capacidade de análise, olhar além da próxima eleição e, fundamentalmente, “deixar de lado as mesquindades e os egos que tanto dano têm feito e que têm provocado fragmentação inútil”.

A ex-presidenta defendeu a revisão de modelos econômicos, como o de substituição de importações, para buscar inovação tecnológica e competitividade global. Ela citou o exemplo de “O Eternauta”, quadrinho argentino que conseguiu ser produzido pela Netflix, para argumentar que a Argentina tem capacidade de negociar “de igual para igual” com investidores estrangeiros, sem “subordinar-se ou vender a pátria”.

Cristina Kirchner concluiu seu discurso reafirmando o compromisso do peronismo com a celebração do Dia da Pátria e convidando a todos os argentinos a refletir sobre o futuro do país. “São ideias, não são verdades reveladas”, finalizou, incentivando o debate e a construção coletiva de um novo caminho para a Argentina.

Cultura como arma de resistência: “A identidade argentina não será apagada”
Central no discurso foi a defesa da cultura como ferramenta de luta. “A cultura argentina é a dos desaparecidos de 1976, a das mães da Praça de Maio, a do Diego Maradona. É isso que eles querem destruir”, afirmou, referindo-se aos ataques do governo Milei ao Ministério da Cultura e aos cortes em programas artísticos. Para Cristina, preservar a memória histórica é essencial para evitar que o país seja “transformado em uma terra arrasada para interesses estrangeiros”.

Cristina Kirchner iniciou sua fala desmistificando a cultura popular, afirmando que ela não se limita à música ou à arte formal. Para a ex-presidenta, cultura é “dar sentido”, e essa dimensão se manifesta em atos cotidianos e históricos de resistência. Ela citou como exemplos as Mães da Praça de Maio, que em 1977, com seus lenços brancos, criaram um “sinal de identidade” inconfundível. Da mesma forma, lembrou o gesto de Néstor Kirchner ao retirar os quadros dos ditadores Videla e Bignone, um ato que “também gera cultura”.

A ex-presidenta enumerou uma série de conquistas culturais de seus governos, como o apoio ao INCAA (Instituto Nacional de Cinema e Artes Audiovisuais) com 900 filmes produzidos, a criação do Canal Encuentro e Paka Paka, o desenvolvimento do Centro Cultural Kirchner e da Tecnópolis, e a elevação do PIB cultural a 3,8%, superando setores como mineração e pesca. Em um ataque direto ao governo atual, Kirchner declarou: “Se deram conta que esses caras não construíram nada? Nada! Nem uma puta escola, nem um puta edifício, nem um puta monumento, nada! Eles mudam o nome de sua única obra… Sua única obra é mudar o nome do que outros fizeram, ou de não estar. Que medíocres, que chatos.”

O ponto alto de sua retrospectiva cultural, no entanto, foi o Bicentenário da Revolução de Maio em 2010. Para Kirchner, o evento permitiu “recuperar para o povo o 25 de maio”, uma data que, segundo ela, havia sido “apropriada pela historiografia liberal”. Ela relembrou o desfile com milhões de pessoas e a anedota do carro alegórico dos povos originários que, por um acaso, saiu antes do carro da “Pátria voadora”, simbolizando a primazia dos povos origens sobre a formação do país.

Néstor Kirchner e o legado de 2003: lições para o futuro
Ao lembrar do marido e ex-presidente, Cristina destacou como o governo de Néstor, iniciado em 25 de maio de 2003, resgatou a Argentina do caos pós-default. “Ele governou sem medo, com paixão pelo povo. Hoje, precisamos dessa mesma determinação para enfrentar o ajuste de Milei”, disse, reafirmando que o peronismo deve ser “o guardião da soberania econômica e cultural”.

Encerrando com uma mensagem de esperança, Cristina afirmou: “A Argentina não será apagada. Temos a força do povo, a memória de nossos mortos e a coragem de quem sabe que a luta continua”. O discurso, repleto de referências históricas e apelos emocionais, consolidou-se como um marco na resistência política e cultural contra as reformas de Milei, enquanto o peronismo busca reconstruir sua narrativa para as eleições futuras.

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